domingo, 4 de abril de 2010

COMO SE MORRE DE VELHICE


Como se morre de velhice
ou de acidente ou de doença,
morro, Senhor, de indiferença.

Da indiferença deste mundo

onde o que se sente e se pensa
não tem eco, na ausência imensa.

Na ausência, areia movediça

onde se escreve igual sentença
para o que é vencido e o que vença.

Salva-me, Senhor, do horizonte

sem estímulo ou recompensa
onde o amor equivale à ofensa.

De boca amarga e de alma triste

sinto a minha própria presença
num céu de loucura suspensa.

(Já não se morre de velhice

nem de acidente nem de doença,
mas, Senhor, só de indiferença.)

Cecília Meireles

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